quarta-feira, 11 de novembro de 2015

Que diabo é isso?

Bom, respondendo à pergunta título, não é diabo. É diabetes mesmo. Tipo 2.

Não que isso seja novidade. Afinal descobri a danada em 2005, há dez anos. Como quase todo mundo, meio que por acidente. Aquele exame de sangue quando você está gordo mostra uma glicemia em jejum alterada... Assim foi e eu me descobri com 139 de glicose na época.

Como bom hipocondríaco que sou, fui para tratamento. Funcionou. Perdi peso às pampas (para ser preciso, uns 14 quilos). Passei a ir à academia todos os dias, fiquei fortinho e talz. Nada de monstro. Apenas fortinho, com menos de 88 quilos e glicemia em jejum de 84. Controlado e saudável.

O negócio foi tão legal que a médica cortou os medicamentos para reduzir a glicose. Era só maromba, alimentação correta e vida saudável. Dava até para um docinho quando em vez.

Fui numa disciplina invejável por anos. Até que ocorreram dois episódios, quase simultâneos, que desencadearam uma balbúrdia na minha vida. A médica me disse que eu estava curado da diabetes (e eu acreditei....). E entrei numa espiral profissional esquisita, isso entre 2009 e 2011. Nunca mais fui à academia. A disciplina alimentar, que permaneceu por quatro anos, deu lugar à mistura de arroz com batata frita. A quantidade de comida no prato também cresceu. Voltei a comer muito. Engordei. Passei dos 100 quilos de novo.

Pior, passei dos 50 anos junto. Ia ao médico, que pedia exames. Eles chegavam e eu consultava o Dr. Google e analisava eu mesmo meu hemograma. Apertava um pouco aqui, um pouco ali, mas logo caía num pudim semanal. Ou no macarrão com feijão e arroz.

Não teve jeito. 

Deu merda. 

Como era previsível.

Só que desta vez foi diferente. Sempre evitei fazer exames de sangue nesta época do ano, pois queria liberação para encher o rabo de comida natalina (sim, encher o rabo de peru... pode fazer a gracinha aí, à vontade). O Natal emendava com meu aniversário e com muita sorte, fazia os exames em julho. Aí, era o esquema Dr. Google.

Agora não. Por algum motivo que não entendo ainda, agora encarei os exames em novembro. Ainda bem.

Esperava ter de trocar o remédio da pressão e dar uma glicemia em jejum alta, um colesterol limítrofe, um triglicérides alto. Aparentemente, não tem problema com o remédio da pressão. Mas teve mais coisa. Não foi apenas glicemia em jejum alta. Foi um coquetel de problemas.

Pelo menos foi o que o médico que o Edmar Barros me indicou, o Dr. Josélio Melo Júnior. Um médico igual à mim, tremenda figuraça. Deve medir no máximo 1,60m. Magro, transparente pra cacete, daqueles que chega a doer quando falam (igual a mim. Adoro...) e cheio de camaradas malhadaços na antessala, pois ele sabe construir gente musculosa de verdade, aquele pessoal que treina loucamente e come batata doce e ovo sem gema no banheiro da academia (com todo o respeito, eu não dou conta de comer em banheiro, mas acho legal gente forte....).

Já estranhei quando a secretária dele marcou para um sábado, às 19h. Pensava que todo médico estava jogando golfe a esta hora. Dr. Josélio não. Tinha fila no consultório. Fui atendido uns 40 minutos depois. E veio a enxurrada de notícias.

No meio de vários sinais esotéricos, que adoro, ele pegou cinco (número cabalístico) cartões, escreveu atrás palavras como "cuidar", "complicações", "morte súbita" e me deu para sortear. Mandou embaralhar sete vezes (adoro...) e mandou tirar. Saiu complicações. Ele disse que meu cérebro já tinha escolhido. Eu iria, quem sabe, perder as pernas, ficar cego, aquelas coisas que só ocorrem aos diabéticos.

Não aceitei. Peguei o cartão "cuidar" e batia incessantemente nele. Convenci o cara que, embora a programação cerebral tenha escolhido as "complicações", a vontade era cuidar.

Fomos em frente. Analisando friamente meu exame, Dr. Josélio disse que eu teria, naquelas condições, no máximo uns cinco anos de vida. Com sorte, um enfarte daria jeito sem maiores complicações. Com azar, um AVC.

"Você não vai ver a formatura da sua filha mais nova".

Essa foi uma das frases mais gentis que ouvi dele. Não que fale palavrões, ao contrário. O homem é um gentleman, sotaque nordestino afiado, bigode cortado com precisão suíça. E diagnóstico idem. Destruiu minha mania de Dr. Google. Para sempre. E deu o susto final.

"Seu Diabetes Melitus tipo 2 está descompensado. E há agravantes que são os vilões, muito pesados. Colesterol bom e Vitamina D3 em baixa, triglicerídeos, ácido úrico, CPK, Ferritina, Insulina e Homa em alta", me contou. "Mas o pior é que sua Hemoglobina Glicada é de 8,3%. Usamos remédios até 8%. Insulina, a partir de 8,5%. O sonho de todo endocrinologista é receitar a insulina. Então, o que fazemos no seu caso?"

Eu não sabia.

Ele sim. 

Faz-se um tratamento de choque. Porrada mesmo. Remédio pra caramba, incluindo uma injeção diária na barriga, que não é de insulina, mas também tem a função terapêutica de mostrar como vai ser a vida furando a pança todos os dias. Saí com as receitas e com a sensação de que, desta vez, não dava mais para brincar.

Passei a noite de sábado meio aéreo, assim como a Andreia, mas já comecei a comer menos imediatamente. A feijoada do almoço foi sucedida por um wrap de frango. Nem programei a despedida da comilança. O susto foi suficiente. 

Amanheci o domingo comendo o pouco que ele me recomendou - basicamente, tapioca, os wraps, queijo branco minas frescal, carne magra, salada de folhas, macarrão integral, frutas como maçã, ameixa e uva, suco de uva integral e... E... E é isso aí. Nada de pão (nenhum), nada de leite, nada de arroz (nem o integral), nada de batata, de cenoura, de picanha, de beterraba, de fraldinha... 

Bom, dali fui para o pit-stop da farmácia. A conta da irresponsabilidade também foi financeira. Além do valor da consulta, o bolso foi esvaziado em R$ 1.287,04. E a conta ainda aumentará - os remédios não cobrem os 45 dias de tratamento de choque . Pela primeira vez, parcelei remédio no cartão de crédito.


Meus novos companheiros de vida, com destaque para a
canetinha e as agulhas de furar a barriga

Da farmácia, fui para a academia. Não dá para querer viver só de remédio. Matriculei-me em pleno domingo. Deve ser algo inédito. 

Mas também comprei uns charutos. Isso pode. Afinal, não é de comer.

Passei o domingo me equilibrando entre o que ia entrar pela boca e a rotina dos remédios. São três depois do café, além do de pressão, a injeção e dois na hora do almoço e um depois do jantar, fora os remédios manipulados, que não estão prontos ainda. Acho que fiz uma dieta legal. Comi o seguinte:


  • Café - 9h

300ml suco de uva integral Uma folha rap10 integral Três fatias finas queijo minas palma frescal 



  • Lanche manhã - 12h 
Dez castanhas de caju sem sal



  • Almoço - 14h45 
Filé mignon com pouco sal grelhado, acompanhando de Salada de tomate picado, rúcula, alface americana e agrião com brócolis cozidos ao alho, três metades de palmito, uma cebola em conserva  natural.Bebida: água com gás



  • Lanche - 19h

Uma maçã Fuji



  • Jantar - 22h30

300 ml suco de uva integral 
Uma folha de rap10
Duas fatias médias de queijo minas frescal palma



Fui também ao supermercado, comprar comida adequada à realidade. e fiz meu almoço de segunda. Um almoço bem ruim, bem sem tempero, bem sem gosto. Que é para eu aprender: abobrinha assada, filé grelhado e macarrão integral sem molho. Comida feia pra cacete...

No final da noite, sentando no sofá, eu chorei. Não podia ser diferente. Não de saudade da comida, mas pela minha burrice. Não dá para arriscar, para brincar, para jogar com a vida. Mas o choro passou e nem tudo é ruim. 

Afinal, pode tomar vinho. 

Mas nem isso eu quis. O troço é sério. E são 45 dias de luta. Luta esta que eu vou dividir em capítulos sobre meu dia-a-dia. 

Esse foi o primeiro. 

Amanhã tem mais. Afinal, havia uma segunda-feira...